domingo, outubro 26, 2003

Lágrimas

Lágrimas caídas
Do teu rosto doce e terno
Reveladas tristezas reprimidas
Da alma fria de inverno...

Um abraço forte
Tento-te confortar...
Palavras quentes
Que te tentam alegrar...

Uma noite de magia
Que vai da alegria à dor
E regressa à alegria
Para acabar no teu calor...

Precisas de mim
Tanto como preciso de ti
Amor profundo, sem fim
Em teu ser, renasci...

sábado, outubro 25, 2003

Murmúrio da escuridão

Noite calada no murmúrio, na solidão colectiva. Descansam nela todos os seres que do dia fazem vida, mas há sempre alguém que na noite tudo tem. Filosofia de vida?! Diversão?! Trabalho?! Há porem quem dela nada tem, há quem dela tudo tem, mas quem faz dela vida?! Que proveito tira?!
Que viagem nocturna navega no pensamento humano que o faça gostar da escuridão?! Magia, ou medo que ela seja verdade?!
Insónias quem não tem?! Obrigações toda a gente tem, e será esta uma das razões para uma vida diferente do normal? Normal? O que será normal dentro de uma escala de obrigações e da falta de tempo para se conseguir viver com tudo o que se gosta? Sonhando?! Sonhando e sendo inconsciente nesse acto talvez seja uma solução satisfatória, pelo menos para a maioria. É com ela que alguns, ou quase todos, satisfazem as necessidades fisionómicas. Será mais saudável?! Pelos vistos sim!

Mas afinal quem compreenderá a vida da gente que da noite faz dia?

segunda-feira, outubro 13, 2003

Manhã

Atiro pela janela o último cigarro daquela noite, levanto os olhos... não há céu. Claustrofobia, calor... o ínicio do fim.
Baixo os olhos, o chão estacionário sob os meus pés... esse chão tantas vezes o caos da vertigem sonhadora.
Um último olhar pela janela. A magia da noite poente defronte dos olhos, esta paisagem, que se prepara para a banalidade quotidiana; será uma futura recordação?
Volto-me novamente, prisão libertadora, visão tentadora, corropio de sentimentos... e penosamente a madrugada torna-se um último abraço perdido num infinito mar, que de tão calmo, torna-se detentor de uma raiva tão silenciosa quanto contraditória.
O corropio atira-me para os primeiros raios de sol...
Os meus pés agora sobre a calçada húmida... de água? De sangue?
E o planeta dilui-se, na manhã dolorosamente mais incerta... e a noite perdeu a vontade de sonhar.

Descanso

Apertar os últimos botões da camisa
Vestir o casaco preto elegante
Calçar os sapatos reluzentes
E atar com força os atacadores...

Contemplar o espelho na parede
Face estranha, pálida, fria...
Olhos raiados de sangue, mas calmos
Pentear-me com a escova já gasta...

Ataque de tosse, garganta seca
Talvez um último copo de água
Para saciar a única necessidade saciável...
Alívio momentâneo que passa depressa...

Assinar a carta com letra bonita
Não borrar a última assinatura
Com a lágrima não evitada que cai...
Chorar não ajuda, nunca ajudou...

Subir para a cadeira com cuidado
Arranjar a gravata com nó apertado
E prende-la bem alto e firme...
Respirar fundo, sentir a determinação...

Um pequeno salto em frente
Cadeira tombada para um lado
O mundo em suspenso, por um fio
No ar dançar aquecido pelo frio da morte...

Paz, finalmente,
Descanso, por fim...

quarta-feira, outubro 01, 2003

Sonhos sombrios

O sonho começava como sempre, meio tremido na escuridão que se avizinhava e que sempre o fazia tremer de medo e nervosismo. A luz difusa iluminava apenas um metro à sua frente enquanto percorria o corredor comprido, deserto e interminável. Em cada porta que passava encontrava um nome que reconhecia não sabia como, eram nomes de figuras anónimas que lhe passavam pela mente. Mais alguns passos e ele sabia o que se seguia, a porta a abrir com uma figura alta e bonita saindo correndo, gritando, tentando atingi-lo no peito com seus punhos fechados. Ele adorava este ponto do seu sonho devido à sensação de impunidade e às cócegas que lhe pareciam provir daqueles míseros socos no seu peito. Como sempre afastou com uma mão a rapariga e continuou a andar por aquele imenso corredor que cheirava tanto a mofo e humidade, olhando os nomes nas portas, e pela primeira vez pareceu ver uns números escritos nas portas, marcados como que a sangue, mas decidiu não ligar, era a primeira vez que algo lhe acontecia neste sonho que ele tão bem conhecia.
Tal como sempre, o seu sonho iria agora tornar-se mais sombrio, mas isso só contribuía para o divertir mais. Sombras passeavam-se agora pelo corredor e de vez em quando deixava de ver à sua frente mas quando isso acontecia parecia que as portas se iluminavam, com um brilho estranho e difuso, e deixavam escapar um grito que ele atribuía a uma luxúria louca, um grito parecido saído dum Inferno de proporções bíblicas. Uma gargalhada forte saiu dos seus lábios, sabia que não faltaria muito tempo para acordar, que só faltava um ponto para que acordasse lívido e mergulhado em suor, mas sempre, sempre, com um sorriso no rosto. Seria agora que ia acontecer? E como se os seus pensamentos tivessem sido lidos, aconteceu, todas as portas se abriram e de lá saíram figuras tão desfiguradas que ele não sabia se havia de considerar um cenário de terror ou de circo. Era agora, ao primeiro toque, que ele ia acordar mas tal não aconteceu, a primeira figura tocou-lhe com uma tal intensidade que sentiu seu sangue gelar, o seu olhar cravou-se de um espanto enquanto uma a uma as outras figuras lhe tocavam e como que lhe deixavam uma marca cravada a gelo no seu corpo, sentiu-se desfalecer enquanto caía ao chão, violado na sua alma, apodrecido, velho no seu próprio corpo, enquanto via uma ultima horripilante criatura sair da porta 24.


Extracto do jornal “Noticias Diárias”
Foi encontrado morto em sua casa, pelas 9 horas da manhã, F. D., no que se pensa ter sido um ataque cardíaco. Este caso levanta suspeitas à polícia por se poder tratar de mais um dos assassinatos que tem atormentado o país, já que por cima da cama se encontrava o número 25 escrito a sangue. O que vem atormentar os investigadores, segundo fonte anónima da policia judiciária, é o facto de o sangue não parecer provir da vitima e de se encontrar 24 caveiras humanas no quarto. Segundo a mesma fonte policial “as caveiras foram alinhadas desde a parede da cama até à parede oposta do quarto, com doze caveiras de cada lado, como que se assemelhando a um corredor. O mais estanho deste caso é este morto se encontrar com os olhos arregalados como que de espanto mas na sua face parece que se vê um sorriso. Se este é o mesmo criminoso realmente mudou o seu modo de actuar.” Este caso vem assim lançar dúvidas sobre os assassinatos em série, em que o número de mortos é escrito a sangue da própria vitima por cima da cama, esperando-se que em breve se apanhe este hediondo assassino.