quinta-feira, outubro 28, 2004

Tonan, o Barbariano - 4ª Parte

"Olha qui coisa tão linda, tão cheia dji graça, é a não-sei-quantas qui coiso, a mina qui passa, é a coisa mai linda qu'eu já vi passaaar..."
Assim trauteava o cabeçudo aprendiz de feiticeiro aquela velha música das praias de Titiloqui, o país mais solarengo do grande continente de Takar. Sob domínio Pharpal, podia não ter a aura de sofisticação e requinte de Létis, a sua homóloga Tartaglionesa, mas compensava-o com o seu clima quente e a sua exótica fauna local. Por assim dizer...
O jovem fazia esvoaçar a túnica encardida enquanto saltitava pelo carreiro que atravessava o bucólico bosque, degustando aquelas saudosas recordações da sua viagem de fim de curso, a lembrança daqueles cálidos encontros com as jovens «titilôcas» (e também as não muito jovens, diga-se de passagem) ainda acariciando a sua memória... Ao ponto de ter de compor, dissimuladamente, uma prega no manto.
Não havia passado muito tempo desde que concluira o curso de Iniciação às Artes Místicas e Afins na Faculdade de Ciências Mágicas, nas soalheiras encostas de Capanova, uma localidade no pequeno país de Gurtapol.
Bom, não era o mesmo que um canudo em Iniciação às Artes Arcanas, Marciais e Outras Que Tais, na mítica Cidade-Fortaleza-Universidade de Oxifarad, nas agrestes montanhas de Shrlombo-Tim, mas já era alguma coisa. Era uma rampa para se lançar em estágios mais elaborados, e quiçá até um Mestrado!
Pelo menos fora o que lhe garantira o velho Professor Kibomba, o seu tutor durante as árduas duas semanas de curso.
"Tu lembra di qui este curso, apesar di útil, não chegará pra desenrascar! Lembra di qui ainda tem qui ler muita folha de chá e tripa de saguim pra chegar à unha do pé di qualquer grandi sábio! Tu lembra ainda de que......
...Chi, esqueci!"
Fora a última vez que vira o velho sábio antes deste desaparecer misteriosamente para destino incerto, com a igualmente incógnita quantia que cobrara como propina aos alunos inscritos (sim, todos os nove! Os Nove? Hum... Será que?... Nahhh)
Mas tinha o seu canudo! E apesar de ter perdido a conta ao número de vezes que lhe bateram a porta na cara, lhe chamaram "Palhaço!" ou atiraram lama (queria pensar que era lama), nunca desistiu de procurar o seu lugar no conturbado mundo de então.
Até aquele momento. Estava farto. Preferia viver como um eremita porco e sujo na Floresta Negra do que continuar a gramar aquelas merdas.
Olhou para o seu canudo como se fosse um bocado de papel higiénico várias vezes reutilisado, e lançou-o com um grito de raiva para lá das árvores que o rodeavam...
...até que o ouviu embater em algo que, julgara, seria grande e pesado. Não pelo ruído que o canudo fizera ao bater. Antes pelo tamanho das árvores que começaram a ser arrancadas na curta distância que o separava daquilo... A facilidade com que eram lançadas vários metros acima e além da sua cabeça também não o tranquilizava.
O terror que dele se apossara já lhe tinha ensopado as vestes quando se encontrou, finalmente, frente a frente com a temível criatura. Era mais baixa do que estava à espera, mas isso não queria dizer nada. Tinha um aspecto que feria só de olhar, e do cheiro nem falar. Tinha uns desenhos no corpo que faziam lembrar o rapaz de umas histórias que ouvira enquanto criança, de uns vagabundos meio tresloucados que gostavam de andar à bulha e de apanhar grandes bebedeiras...

Sim, só podia ser! Estava a olhar para um Barbariano!

(fim da 4ª Parte)

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