(ANTES DE MAIS, E DEVIDO AO GRANDE INTERVALO DE TEMPO ENTRE O ÚLTIMO CAPÍTULO E O ACTUAL, URGE FAZER UM RESUMO DA HISTÓRIA ATÉ ESTE PONTO)
- Entra em cena Tonan, o Barbariano, imundo salteador e temido morador da Floresta Negra.
- Após intensa sessão de brainstorming entre os seus dois neurónios (coisa rara!), Tonan decide rumar a Tarkul, capital de Takar, no intuito de... bem, não vamos já estragar a surpresa ao leitor, não é? Mais vale dizer que o herói morre no fim... oh, porra!
- Cena de acção na qual Tonan despacha uma patrulha de soldados. Alguma violência gratuita.
- Mudança de cenário: na estrada para a capital, encontramos o jovem Vitus, aprendiz de feiticeiro, também conhecido como “o Vitalho, cabeça de ca...”
- Vitus encontra Tonan, mas este não parece estar na melhor das suas más disposições e demonstra-o, prontamente, arrancando várias árvores pela raíz e lançando-as a uma distância considerável. Vários recordes de lançamento de dardo e peso são batidos.
- Vitus, em pânico, urina na túnica. Ah, e ainda consegue conjurar um misterioso feitiço contra o seu obtuso agressor...
TONAN, O BARBARIANO – CAPÍTULO VI – IT´S MAGIC, YOU IDIOT!
“ – Crescepello!”
A complexidade do campo da magia é algo que continua a maravilhar até os mais eruditos. A enorme variedade de fórmulas e conjurações existentes só é ultrapassada pela miríade de aplicações diferentes que o engenho humano, sempre adaptável, se lembra de conceber. Se para fins nobres ou... não tão nobres, tal não podemos assertoar com exactidão.
No entanto o sempre avisado leitor, conhecedor da natureza humana, decerto terá ideia da proporção entre os honestos aplicadores da magia e os que lhe dão pérfido uso.
Tal como no mundano dia-a-dia, também no plano arcano existe um cisma entre benfeitores e charlatães, entre altruístas e egoístas, entre homens santos e imundos filhos da puta, incluindo a mãe.
Retrato vivo desse cisma é a rivalidade entre os paladinos da Irmandade do Pastel (um grupo secreto que se esconde sob a fachada de um clube gastronómico) e a Sociedade de Prião, um enorme consórcio de Guildas mágicas e outros representantes desonestos como banqueiros, conselheiros reais, macumbeiros e cartomantes (por ordem crescente de inocuividade).
Mas divago.
“ – Crescepello!” – bradou Vitus, uma aura verde-alface emanando de si, qual Maria José Valério.
Quase imediatamente, Tonan sentiu um formigueiro percorrer-lhe o corpo todo.
“Que diabo”, pensou. Não podiam ser pulgas. Essas, as carraças e demais parasitas há muito que tinham desistido de povoar tão hedionda epiderme.
Só então Tonan reparou que a sua pilosidade corporal, já de si equiparável à de um mamute, aumentava a olhos vistos! Em pouco tempo, os seus pêlos estavam tão crescidos que Tonan não pôde evitar tropeçar e enrodilhar-se neles, ficando convenientemente bem amarrado no processo.
“ – Ha ha ha! Não pensavas poder comparar-te ao grande Invictus, o Mago Supremo!” – Vitus quase voltava a molhar a túnica com a emoção – “Na na na, nem penses nisso!” – Tonan, passada a surpresa inicial, tentava soltar-se daquela prisão capilar.
“ – Queres voltar a provar outro dos meus potentes feitiços? Garanto-te que o próximo não será tão meigo para com a tua pessoa!”
Tal bravata esganiçada não correspondia nem de perto nem de longe à realidade. De facto, “Crescepello” era o único feitiço do currículo de Vitus que se podia considerar vagamente ofensivo. Vitus era licenciado em “Iniciação às Artes Místicas e Afins” pelo famigerado Professor Kibomba, reputado vidente/aldrabão, procurado em três países por fraude e burla agravada. Actualmente, encontra-se em parte incerta – não sem antes se ter eclipsado com as propinas dos seus pupilos; a meio do curso, entenda-se.
Na verdade, “Crescepello” foi criado, sabe-se lá quando, por um feiticeiro amador, barbeiro de profissão, quiçá por falta de clientela.
Muito simplesmente, bastava ao dito escanhoador sussurrar a fórmula mágica a qualquer incauto que lhe passasse à porta do estabelecimento...
Mas tal história não estava destinada a ter um final feliz, pois é sabido que a Fortuna (leia-se
capricho do autor) dá e tira com igual celeridade.
Pois então o anónimo baeta, na ânsia de aumentar os seus dividendos, teve a triste ideia de mudar para o ofício de cabeleireiro. Ora, se até aqui o desmesurado crescimento da barba e cabelo dos seus clientes não lhe proporcionava senão avultada freguesia e gorjeta, o mesmo não sucedeu com
as suas clientes. Poupamos os leitores sensíveis às cenas de indizível horror e violência que tiveram lugar naquele salão, quando respeitáveis aristocratas se viram, de um momento para o outro, cobertas por uma espessa carpete capilar...
Por fim, aleijado, falido pelos processos em tribunal e com a reputação arruinada, decidiu pegar na sua fiel navalha e... ZÁS! Cortou ambas as patilhas; não queria ser reconhecido quando saísse do país...
“ – Muahahahaha! Irónico, não, Barbariano? Um home...euh, um animal tão possante e não se consegue desembaraçar de si mesmo!” – Vitus voltou ao ataque, inspirado – “Mas se nem eu me consigo desembaraçar de mim mesmo, desta inconstância do ser,desta consciência do sofrimento... desta...
desta murzels and the freckles and the beautiful fireworks exploding into the sky e...”
>>BOUM!<<
O punho de Tonan descera sobre a cabeça de Vitus com óbvio momento linear. Mas, coisa incomum, Vitus limitou-se a deslizar para o solo e permanecer lá, inconsciente. Os seus olhos não saltaram das órbitas, nem o seu crânio se abriu, nem o conteúdo polposo e cinzento se espalhou por todo o lado.
Não, Vitus estava vivo. Pois era essa a vontade de Tonan.
(continua...)