sexta-feira, novembro 30, 2007

Subitamente

Subitamente algo me aconteceu, enquanto vivia a minha vida. Subitamente comecei a sentir-me deprimido, subitamente comecei a sentir-me stressado. Subitamente nada do que vivia fazia sentido.
Sabes o que aconteceu? Sabes o que me deu?

A minha vida está a mudar todos os dias,
de todas as maneiras possíveis.
Nada disto é o que parece,
eu continuo a ser quem sou.

Por isso ajuda-me.
Dá-me as tuas mãos e vem comigo,
e assim não poderei fugir.

Dá-me apoio nos sonhos,
que nunca são o que parecem.
Mudemos a realidade ao mundo.

Subitamente algo me aconteceu enquanto vivia o meu sonho. Subitamente comecei a sentir-me acordado, subitamente comecei a sentir-me apavorado. Subitamente tudo começou a fazer sentido.

quinta-feira, novembro 22, 2007

Mais um Outono

Sinto o frio e o vento...
A pele seca, os lábios também.
Sinto a chuva e o ar sombrio...
A voz rouca, trovejando além.

A sombra em mim desapareceu,
O céu cobriu e a água à terra desceu...

Sinto a luz e o som...
A natureza relampejante.
Sinto o medo e a aproximação...
A energia trespassante.

O medo em mim desvaneceu,
E a terra molhada ao céu agradeceu...

segunda-feira, novembro 05, 2007

É uma dor que se agrava quanto mais me minto

Convenço-me que não. Que nada do que sinto é real, que dói-me aqui o peito e este aperto é do calor, é falta de ar. Só pode ser. Afinal, 33 graus são suficientes para a taquicardia. A roupa é pouca. A pele queima os ossos e tudo se estreita quando te penso. Mas, não. Não te penso. Não penso. Sangro demais por dentro para pensar. É do Verão esta ferida, esta desidratação de amor. O melhor mesmo é beber qualquer coisa fresca que me acaricie a boca e me gele o sentir. Saio talvez para lanchar, peço um sumo de laranja bem frio, um pastel de nata, uma torrada, qualquer coisa que me distraia os dedos da escrita e a alma de ti. E pronto, deve bastar. Pego no carro, abro a capota e a aflição não passa. Sem nó nem piedade, um sufoco apodera-se do corpo. Pesam-me os olhos, as mãos. Primeira, segunda, 60 km/hr e o vento a esvoaçar-me o cabelo e o juízo. E arde-me a saudade. Persuado-me que não é saudade. Claro que não é saudade. Como pode haver saudade de algo que nunca existiu senão no coração alcatifado? E eu afrontada, vidrada no alcatrão que sempre me abraça a mágoa e a vontade de fugir. Acelero sempre ao sinal vermelho. Tenho pressa de viver, de tocar o céu. Que ideia parva, tocar o céu. É tão mais fácil bater com a cara no chão, desfazer todos os sonhos nos rails do impossível e da desilusão. Travão a fundo. Milonga del Angel do Piazzola a vibrar-me os sentidos. Chega. Páro. Merda para o calor, a culpa é do aquecimento global e das pessoas. Que raio de ideia de destruirem o planeta e, aos poucos e poucos, a minha respiração. Dou por mim quase em sufoco por não te ter, mas a culpa não é tua. É mesmo desta brasa que me rasga a paz e o viver. Que culpa podes ter tu. Nenhuma, obviamente. Talvez devesses sossegar-me a inquietação com os teus braços. Estremecer-me com a tua boca nos meus lábios, mas não. Agora está muito calor. A ansiedade mistura-se com este ardor incandescente e com a inflamação do meu peito. Uma bebida bastaria e já falta pouco até à pastelaria. Entro. O pior já passou. Aqui o ar condicionado, quase gélido, insensível a este fogo e a ti basta. Mas, não basta nada. Porra, logo havias de ter decidido vir para aqui também tomares um chá para acabares com o glacial que te cobre o querer. Raios me parta a escolha e este desassossego. Digo boa tarde, só porque está calor. E para me convencer que não. Que nada do que sinto é real, que dói-me aqui o peito e este aperto é do calor, é falta de ar. Afinal, amar alguém assim é impossível.

Vanessa Pelerigo

quarta-feira, outubro 31, 2007

A vida em directo

Toca o despertador, o começo de um novo dia, deixo-me ficar na cama e desfruto destes últimos letárgicos momentos. Depois de me levantar a custo, arranjo-me e tomo o pequeno-almoço enquanto ligo a televisão e vejo as últimas noticias. Mais um bombista suicida provocou 12 mortos num mercado em Bagdad. Não pude deixar de reparar na expressão de atrapalhação da pivot, não seria certamente pelo conteúdo da notícia em si que estaria naquele estado, afinal noticia seria não haver atentados suicidas no Iraque! Parecia que estava a presenciar algo fantástico e que lhe estava a afectar a concentração na apresentação do jornal da manhã. Deixei de me preocupar com as atrapalhações da pivot e saí de casa em direcção ao emprego. Meti-me no autocarro e ao entrar reparei que toda a gente olhava para mim como se fosse algum criminoso com um cartaz em cada esquina a dizer procura-se, reparei que naquele preciso instante toda a gente puxava dos seus telemóveis e escrevia mensagens freneticamente. O que é que se estava a passar? Seria pura coincidência toda a gente olhar para mim com olhar inquisidor e começar a escrever uma mensagem nesse mesmo instante? Seria eu a cobaia numa experiência underground? Saí do autocarro, no preciso instante em que tinha começado a chover, apressei o passo e a chuva aumentou a intensidade até que tive de encontrar refúgio debaixo de um telheiro, parou imediatamente de chover, já não sabia o que havia de fazer, por mais que tentasse fugir ao destino ele perseguia-me sem dó nem piedade tal como se fosse um programa com capacidade para seguir e antecipar todos os meus passos ou melhor, os meus pensamentos! Este meu pensamento foi interrompido pela imagem de um vendedor de chapéus de chuva, veio mesmo a calhar, paguei e prossegui caminho até chegar a um cruzamento onde estava um grupo de pessoas que à medida que me ia aproximando ia reconhecendo como pessoas famosas, uns do mundo da televisão, outros do mundo da escrita, outros famosos eram por aparecer nas festas do jet set, todos em amena cavaqueira, que estariam todos ali a fazer? Passei por eles, fez-se silêncio, levantei os olhos para ver o que se passava naquele grupo e vi que todos olhavam curiosamente para mim, passei por eles no mesmo passo sem me mostrar afectado e segui caminho até chegar ao largo onde estava o escritório onde trabalhava, estava mesmo em frente um placar publicitário com um homem representado, era incrivelmente semelhante comigo, em baixo aparecia escrito o slogan “Seja o próximo a ficar nas bocas do mundo”, as semelhanças com a realidade eram assustadoras. Entrei no escritório, cumprimentei a dona Palmira da recepção com o “bom dia” habitual, não me respondeu, ainda assim manteve fixa em mim toda a atenção como se estivesse a seguir a novela da noite.

- Passa-se alguma coisa dona Palmira parece que viu um fantasma!

- Não é nada Pedro, não consegui pregar olho toda a noite foi isso.

A sua resposta deixou-me ainda mais espantado, como é que sabia o meu nome? Nunca me tinha apresentado a ela, pelo menos que me lembrasse. Continuei o meu caminho pelo corredor em frente e enquanto não chegava ao escritório propriamente dito ia-me perguntando e preocupando com o que se iria passar a seguir, como é que seria o comportamento dos meus colegas? Não demorou muito a saber a resposta. Estavam uns sentados em frente aos computadores outros de pé a falar, parou tudo quando cheguei como se fosse o patrão a anunciar novos despedimentos na companhia, segui com passo estugado em direcção à minha secretária enquanto ouvia cochichos e risinhos. Estava a ser uma manhã maldita, não via a hora de terminar o dia. Sentei-me em frente ao computador e comecei por consultar o meu e-mail, tinha a caixa cheia de junk mail, olhei rapidamente para os assuntos de cada mensagem: Be the star of your company, Be famous from one day to another! Tomorrow shall i bring the umbrella? Esta última havia sido enviada à 6 minutos atrás, era impressionante como estes assuntos se assemelhavam ao que me havia acontecido esta manhã, apaguei todo aquele lixo e tentei concentrar-me no meu trabalho. Ainda assim era difícil, sentia-me o centro das atenções. Resolvi retardar propositadamente a hora de almoço para as 13h a fim de evitar uma multidão de colegas todos curiosos com a minha pessoa. Seria imaginação minha ou aquilo que eu pensava estar a acontecer estava a acontecer na realidade? Como de há um tempo para cá não conseguia dormir, esta impressão podia ser do cansaço, mas tantas coincidências juntas era de desconfiar. Ás 18 era hora de abandonar o posto de trabalho, resolvi ficar mais um tempo de forma a deixar passar a hora de ponta de forma a poder avaliar melhor a situação. Saí uma hora mais tarde, mais uma vez começou a chover torrencialmente no preciso momento em que pus um pé fora do edifício, mas desta vez estava prevenido com um guarda-chuva. Percorri em sentido contrario o caminho que havia feito de manhã, mas desta vez, para além da abundante chuva, trovejava, por sinal muito perto do local onde estava, o ruído era ensurdecedor. De repente dei-me conta de um raio cair mesmo no prédio em frente, que dia aquele! Cheguei à paragem de autocarro e esperei até que chegou o autocarro que me levaria de volta a casa. Entrei, parou imediatamente de chover, deparei-me com um autocarro sem nenhum lugar sentado ainda assim não se podia considerar cheio, todos pararam o que estavam a fazer para me olhar curiosamente, no fundo só se ouvia:

- Só espero que agora não nos caia um raio em cima!

De repente vi uma pessoa a levantar-se e a acenar na minha direcção, como se eu fosse uma câmara de televisão, e ela estivesse a mandar cumprimentos para a família lá em casa, olhei para trás para ver se estava alguém que pudesse justificar aquele comportamento, nada, estava tudo sentado a olhar, eu já enervado com todos aqueles comentários e atitudes perguntei:

- É alguma coisa comigo?

- E se fosse havia algum problema?

- Se me estivessem a acenar e eu não conhecesse essa pessoa para nada é obvio que havia algum problema.

O indivíduo de repente puxa de uma navalha e tenta-me atingir.

- Agora vais ver o que é um problema

Desferiu diversos golpes, e eu, a custo e com a ajuda dos solavancos do autocarro, conseguia-me esquivar. Na altura em que ele tentava desferir outro golpe consegui enfiar-lhe um soco na cara, acabou por tombar, altura em que o autocarro parou e aproveitei para fugir. Claro está que a chuva voltou em força enquanto eu corria com todas as forças que tinha, até que cheguei a casa, imediatamente parou de chover. Sentia um rubor na face esquerda, pus a mão na cara e vi que estava a sangrar, aquele filho da %&#) tinha-me atingido.

Depois de fazer o tratamento da ferida e ter trocado de roupa, liguei a televisão, estava a dar o jornal da noite, o pivot que apresentava o jornal virou-se para mim e interrompeu por instantes o que estava a dizer, tentou retomar o raciocínio mas era obvio que estava perturbado. Eu já enervado com tudo aquilo grito em voz alta:

- Mas que raio se passa aqui!!!? Não têm uma vida própria, porque carga de água me estão a observar, isto é alguma experiência e eu sou a cobaia, vão-se mas é f#$&!

O pivot tinha enrubescido era notório que tinha ouvido tudo o que tinha acabado de lhe dizer. Até que se decidiu

- Caros telespectadores, vamos ter que interromper este telejornal devido a problemas técnicos esperamos voltar com a maior brevidade possível.

Resolvi desligar o televisor, jantei e fui-me deitar na esperança de na manhã seguinte não ter passado tudo de um pesadelo.

Na manhã seguinte acordei em sobressalto, estava curioso por saber se tudo aquilo era mesmo real ou não. Levantei-me num ápice e liguei a televisão. A pivot estava concentrada a apresentar as notícias, não modificou a expressão nem se atrapalhou a falar, parecia ter voltado tudo à normalidade. Este foi um primeiro sinal que as coisas estavam normais. Faltava ainda perceber se as pessoas e o tempo também estavam normais. Lavei-me, vesti-me e comi apressadamente e fui para a rua, estava um tempo magnífico, nem parecia que tinha havido uma tempestade na véspera. Apanhei o autocarro, as pessoas no seu interior pareciam indiferentes à minha pessoa, senti-me profundamente feliz, era mais uma pessoa anónima, sentei-me e olhei pela janela e apreciei a paisagem como se fosse a primeira vez que a estivesse a ver. Desci do autocarro e caminhei confiante até ao meu emprego. Pelo caminho fui abordado por uma freira com um recipiente para moedas ao pescoço.

- Jovem, veja lá se pode dar uma ajudinha para as missões.

- Deixe lá ver o que é que se pode arranjar, irmã.

Peguei numa moeda de 2 euros e introduzi-a no recipiente

- Obrigado jovem, a sua ajuda foi preciosa…Deus faz de nós seus instrumentos, os seus desígnios são insondáveis e todos têm o seu papel a desempenhar, como se todos fossemos actores num grande filme em que todos os nossos actos têm consequências até mesmo no tempo que vai fazer amanhã!

- Irmã nem sabe como, mas compreendo-a melhor do que imagina…

Esbocei um sorriso mesmo antes de virar costas e enfrentar mais um dia de trabalho.

quarta-feira, outubro 24, 2007

Continuando pela estrada

A noite está escura. As nuvens tapando o céu e ameaçando chover por entre as árvores negras, como sombras dançando na escuridão. O assento da mota molhado não me incomoda enquanto o levanto para pegar a arma que assenta tão bem na minha mão. A bala fria entra facilmente e deixo a pistola no meu colo enquanto ligo minha companhia.

O ronronar forte do motor desperta-me à medida que o frio desaparece do motor, só as balas continuam frias no bolso do meu casaco enquanto coloco a pistola no seu coldre de cabedal, facilmente tão acessível. As mãos altas no guiador da minha companhia, sentindo as minhas mãos nuas nos punhos, o cabelo que começa a ficar ralo a abanar à medida que me movo.


...A cabana que deixo para trás mergulhada em sangue nunca mais será a mesma, as almas que lá ficaram sempre presas num suplicio que, se depender de mim, nunca acabará. O cheiro da morte ficará em mim como a memória de quem te matou...


Os quilómetros que ficam à minha frente estão marcados pelo sangue que ainda não derramei e iluminados pelas balas que ainda não disparei. O alcatrão que passo marcado pelo pneu molhado e pelas recordações que guardo. A estrada é apenas minha e da minha companhia.


A estrada é um rio negro marcada apenas pelos traços que o pneu pisa. A canção que me acompanha afasta as memórias, uma canção que canto apenas para espantar os sonhos. O tempo que passei no deserto do mundo apenas contribuiu para alimentar a raiva que não deixo que se apodere. A caminho de mais uma cabana para te vingar.


O blusão negro que me envolve confunde-me com a escuridão que abraço, as calças do fato que me vestem são as do fato com que me enterrarão, na minha mão brilha o anel cujos sonhos nunca mais me apanharão...

sexta-feira, outubro 19, 2007

Realidades... opostas

Apertou o nó da gravata e abriu a porta do quarto... Desceu ao primeiro piso do hotel e sentou-se em frente à farta mesa do pequeno almoço. Que dia aquele!

Penteou-se e saiu da casa de banho... Percorreu o corredor escuro da casa e na cozinha preparou meio papo seco com manteiga. Mais um dia aquele...

Cumprimentou o motorista e entrou na viatura nova em direcção à reunião. Abriu a pasta e releu o discurso novamente.

Despediu-se da Dona Laurentina e entrou na carreira em direcção à cidade. Olhou para a mica e certificou-se que tinha trazido os papéis.

Entrou no edíficio à hora marcada e tentou permancer indiferente aos flashes que se desprendiam das máquinas fotográficas. Dirigiu-se ao púlpito indicado por um assessor... fez uma pequena pausa e começou a falar.

Entrou no centro de emprego dois minutos atrasado e fez-se indiferente perante a antipatia do empregado. Subiu ao sexto andar como indicado por ele. Abriu a porta e aguardou que o homem falasse.

- Caros presentes. Este novo empreendimento desta conhecida multinacional, revela-se de extrema importância como todos sabem... Daqui resultarão cerca de mil novos postos de trabalho e permitirá dar um novo fôlego neste importante sector empresarial.

- Senhor Sousa. Este plano que o centro lhe sugeriu, parece não ter surtido efeito... Daqui não resultou nada que alterasse a sua situação e precisamos de tentar mudar algo para o intruduzir novamente no mundo do trabalho.

Dirigiu-se para a sala reservada para o cocktail, foi-lhe entregue em mao uma garrafa de champanhe... com um sorriso para os presentes, soltou a rolha de forma ruidosa e pediu um copo.

Enquanto o funcionário se dirigiu a uma sala contígua com papelada diversa, reparou na janela que se encontrava á frente... com um ar resoluto que ninguém podia ver, abriu-a em silêncio e saltou para o parapeito.

Três breves segundos... O tempo que o líquido demorou a cair no copo, perante o som das palmas ruidosas na sala.

Três angustiantes segundos... O tempo que o corpo demorou a cair na rua, perante o silêncio daquela manhã calma.



Boa noite este é o telejornal! O Primeiro Ministro inaugurou hoje a nova filial da empresa Kronix em Lisboa.

Boa noite eu sou Comandante Gomes... Dona Laurentina lamento informar que o seu filho morreu hoje em Castelo Branco...

sábado, setembro 22, 2007

Futebol

Dentro de quatro linhas jogado
Por duas equipas disputado
Jogar, fintar, passar, marcar
receita para quem quer ganhar

Onde se gastam milhões
Jogo de milhares de opiniões
Num instante tudo muda
e grita-se golo do outro lado da rua
talvez seja essa a razão
para prender todos à televisão

Num relvado ou num pelado
em parquet ou cimento armado
qualquer lugar serve para praticar
e para do último jogo falar
Jogo de casados e solteiros
de artistas e sarrafeiros
sem grandes exibições
perder nem a feijões

Fadado futebol lusitano
do inicio ao fim do ano
sofrido e trabalhado
de talento imigrado
Alegria e desilusão
Assim soa a nossa canção

Futebol é fantasia
que nos faz esquecer o dia-a-dia
Futebol é paixão

impossível conter a emoção

Jantar Tertúlia d´A Revista P.E.N.A.

quinta-feira, setembro 20, 2007

Um adeus

Um último e suave adeus...

Num mundo cheio de loucura,
De ódios e violência,
De sangue e destruição.
Mil vidas são reduzidas,
Mil esperanças vencidas
Numa guerra sem razão,
Numa doença sem cura
Que mergulha a Terra na demência.

Mais uma jovem vida... ceifada
Pela loucura deste mundo.
Para os amigos a saudade,
Para os familiares a consternação,
Para o ser anónimo a desilusão
Por mais uma acto de insanidade,
Que numa manhã ensaguentada,
Lançou um silêncio profundo.

Um pouco de justiça, meu Deus...


"À memória de Maria José Maurício, brutalmente assassinada na manhã de 18 de Setembro de 2007 em Coimbra, e a todas as vítimas inocentes da loucura deste mundo."

quinta-feira, setembro 13, 2007

P. E. N. A.

Éramos dois sonhadores...
A música naquele entardecer...
E num momento de inspiração
Nasce uma nova canção,
Esquecem-se todas as dores
E algo mágico começa a aparecer...

Pensamentos a fluir
De gente tão normal.
Jovens simples e felizes,
Na escrita aprendizes.
Mas que fizeram surgir
Algo muito original.

Ideias, caneta e papel,
Um computador funcional,
Jacto de tinta, impressão,
Uma tesoura sempre á mão,
Um pedaço de cordel...
Ficou sensacional!

Fiéis e dedicados leitores.
Um desejo de expansão,
Penosos rochedos a escalar,
Mas com vontade de triunfar,
Jovens fortes e sonhadores
Continuaram a missão.

Um olhar cibernético,
Uma crença a alastrar...
À distância de um teclado,
Novo objectivo alcançado.
Textos em ritmo frenético,
Neste novo patamar.

Agora felizes, mas sempre a sonhar...
A nossa P. E. N. A. vamos celebrar!

domingo, setembro 02, 2007

.........

Que dirão aqueles que praguejam?
Que dirão vós que me alvitram...
Estalinhos sanguinários nas minhas veias....

Profundas veias...
Que um dia
Devido às imensas teias
Secarão sentidas...

Qual palhaço que ri de mim....
Vós que me criticais...
Olhai para vós e avaliai-vos

Cromo?Pateta?
Não me substimais,
Assim como não vos substimo,
Sim posso ser careta...

Entretanto....olhai-vos
E dizei-me:
Quando foi a última vez que vos sentistes vivos?
One more time again,
My red rage claims...
Staying in vain..
Don't tell me more my name...

Rage, brave and STAGE....

One hundred gringos in my soul...
Stolen from you
Be your tool...?

Can't stand this pain...
I'm a crazy strange to you...
How could say my name?

Rage, brave and STAGE....

sexta-feira, agosto 31, 2007

O Poema deles

Este poema é dedicado aos 4 anos do Blog d' A Revista P.E.N.A. Quatro anos de puro prazer literário. Para quebrar a rotina de reflexão, escrevo este poema dedicado às milhares de ratoeiras e tentativas que todos nós já tentamos pregar uns aos outros: "Eles vieram?". Por tudo isso, "O Poema deles", dos gajos sem juízo e enlouquecidos, de todos nós. Bem haja...

Todos perguntam por eles,
Numa rotineira paixão.
Não há saída ou diversão,
Que arrefeça essa tentação.

Soa sempre a companheirismo,
Na igreja ou no campismo,
Num bar ou a jantar,
Todos gostam de treinar.

Se és novo camarada,
E o tempo não pára,
Alguém te tentará a piada,
Para estimular sua tara.
Não tenho a certeza como cheguei aqui... A minha cabeça dói-me e não tenho uma noite decente de sono à semanas. Não era suposto ser assim... Suponho que sempre foi.

Sempre foi aqui que estive. Sempre será aqui que tudo se passa...
- Qual a tua fraqueza? - pergunta ela

A minha fraqueza... Como não soubesses. Sempre soubeste tudo sobre mim, sabes que eu hesito na resposta, sabes que eu sei mas não consigo dizer, como se o sair da minha cabeça para a realidade deste sitio fosse tornar a minha fraqueza mais real.

- A minha fraqueza és tu... - Sempre foste, sempre o soubeste, sempre... A minha cabeça dói mais uma vez e não quero que seja assim... Não quero perder estes pensamentos. Quero ser fraco para me consolares.

- A minha fraqueza é o amor... - Detesto como perco o controlo, como aquilo que guardo cá dentro de mim sai tão facilmente e como perco meu auto-respeito assim. Quero ser forte.

- Qual a tua fraqueza? - pergunta ela enquanto seus olhos vêem através dos meus. Enquanto morde o lábio à medida que vê a minha alma. Não fujo, minha cabeça dói-me demasiado para isso enquanto o meu controlo jaz em ruinas a seus pés.

- Tu interesssas-me... - Estas palavras atravessam-me assim ditas, ela não vê o meu amor a seus pés, não vê que me tortura enquanto olho nos seus olhos à espera de ver o que ela vê... à espera de sentir que qualquer fraqueza que possa ter é perdoada.

Só quero amar... ser amado é algo para o qual não tenho controlo, é algo que quero apenas quando passar esta dor de cabeça, apenas quando tiver conseguido dormir.

...

Acordo e sento-me... Ela acende a luz e pergunta que se passou... Nada, volta a dormir, tenho uma dor de cabeça...

segunda-feira, agosto 27, 2007

Nevoeiro

O homem rouco tenta projectar a sua voz, no bar cheio... noite voraz, sinto-me esvanecer... a memória é a mesma, o nevoeiro, o rio...
Sou um ser que tenta nascer, uma certeza que parece morrer, na memória. Essa não está na rouquidão daquele homem, que murmura no caos do café.

8 da manhã e o nevoeiro levanta-se lentamente no rio... Nem café, nem abraço, nem palavras sábias, ou alucínio de uma qualquer cerveja. É o mundo alegremente cruel, tornando-nos frios a cada passo. O homem murmurava rouco contando as histórias da sua existência... eu sou apenas um jovem a despertar para as agruras da vida. Feliz por fora, rasgado no coração. A viagem, os raios de sol rompendo as árvores, aquele abraço que são tantos abraços, e o velho rouco cujo os abraços eram apenas a memória naquela noite ruidosa... A minha única saudade é a da manhã solitária, dez, quinze, vinte minutos atrás...

O homem é o sábio do tempo que um dia serei... projecção futura da minha existência, histórias alegres para contar, uma tristeza no olhar. Agora sou um banal vulto... projectado no rio, quando o nevoeiro por fim levanta.

quarta-feira, agosto 01, 2007

Sonho

Abriu a garrafa lentamente… ritualmente, aliás! Como fazia sempre! Para ele era mais que um gesto! Sentiu o odor do vinho ainda por respirar! Serviu um copo e olhou-o de soslaio!

(ela deve estar a chegar…)

Verificou uma última vez se tudo estava no sítio… Calmo, não apressado ou nervoso… Segui lentamente arrastando os pés pela casa! Verificou tudo pelo menos três vezes! Acendeu, finalmente, umas velas! E deixou-se ficar sentado no sofá…

(com a televisão ligada)

Sentiu o odor do vinho entrar-lhe nos pulmões! Um ritual, é certo!

Deixou-se ficar mais um bocado… E outro… Enquanto esperava por aquele toque de campainha… Aí, sim… O seu coração iria bater forte… Não sabia se estaria preparado para esse bater… Não sabia nada! Neste momento e em outros… Estava muito ansioso… Muito mais que antes, hoje tudo teria de ser perfeito… Nada podia falhar!

Mas estava estranhamente calmo! Tão estranho que nem consigo conseguia lidar… Estava difícil se perceber a si próprio! Olhou pela janela e viu a Lua Cheia!

(e a Lua olhou para ele!)

Hoje era um dos dias mais importantes da sua vida… O Mais Importante até agora!

(a Lua sorriu-lhe, ou ele assim o entendeu!)

Respirou fundo! E decidiu que não o iria provar enquanto ela não chegasse…

Pensou em telefonar-lhe… mas depois pensou melhor… é má ideia… vai pressioná-la e estragar tudo... E isso, era última coisa que pretendia fazer! Também não queria fumar… Que fazer, então, enquanto espera!?

(a televisão continua ligada!)

Sentia-se enlouquecer! Pouco a pouco… A loucura entrava em si! Há pouco, calmo como um rochedo que todos os dias enfrenta o mesmo mar e as mesmas marés com determinação… E agora tempestuoso como esse mesmo mar! Esse mesmo mar… Esse mar que todos os dias tenta, em vão, derrubar o rochedo… Cada vez mais nervoso e impaciente!

(sentiu-se, ele mesmo, parte integrante dessa luta milenar…)

Verificou tudo uma última vez…

(Tlim… Tlam…)

A campainha tocou! Uma vez… É ela pensou… O seu coração precipitou-se a sair do seu peito… O suor escorria-lhe pela testa… O respirar intenso deixava adivinhar aquele nervoso, a que costuma chamar-se miudinho, mas que de pequeno não tem nada… Aquele calafrio no fundo das costa… Aquele formigueiro na barriga…

Precipitou-se para a porta e abriu-a, colocando o mais belo sorriso que pensava conseguir…

No princípio não acreditou no que via… pensou estar a ter um pesadelo horrível… Depois, como não acordou entretanto, começou a pensar que de facto era real… Mas continuava a não querer acreditar… Deixou que uma pequena lágrima lhe escorresse pelo rosto e foi sentar-se na poltrona…


(Entretanto, numa costa longínqua o mar derrubou uma rocha)

segunda-feira, julho 30, 2007

Aqui Jaz

“A fé é o instinto da acção.”

Fechou o livro, ainda, com esta frase na cabeça!

(“A fé é o instinto da acção.”)

Esta, repetiu-se vezes sem conta na sua cabeça!

(“A fé é o instinto da acção.”)

(“A fé é o instinto da acção.”)

(“A fé é o instinto da acção.”)

Na mesma cabeça por onde uma pequena gota escorria…

(Sangue? Suor? Lágrima?)

Ahhh… Bernardo, soubesses a razão que tinhas! – pensou, alto, mas pensou…

Deixou o livro escorregar lentamente pelas suas pernas, enquanto se entretinha com os seus pensamentos!

Imaginou a lapide e a sepultura… Não daquelas em mármore, mas sim daquelas em relva com um pequeno pedaço de granito em forma de escudo, como se vê nos filmes americanos…

(isolada no meio de nada, uma lápide jaz…)

Imaginou as letras cravadas na lápide:

Aqui jaz a minha alma

Eterna saudade

Curioso, pensou, já tinha ouvido falar de vida após a morte, mas geralmente é uma vida espiritual! O corpo morre, enquanto a alma (ou espírito) perdura… No seu caso é ao contrário!

(Como sempre)

Assassinou a sua própria alma! Deixou-a a esvair-se, não em sangue, mas em algo viscoso que não conseguiu identificar… E depois?… Depois enterrou-a! Com a frieza de um homem sem alma! Percebeu finalmente o verdadeiro significado dessa expressão!

(Homem sem alma)

Colocou a lápide fria sob a sepultura e nem uma lágrima verteu! Afinal os homens sem alma não conseguem chorar… Podia dizer-se que ficou triste com este facto… mas será que os homens sem alma podem ficar tristes?

(És um homem sem alma! – gritou um vulto)

Onde estão os sentimentos, no Ser ou na alma, ou é o Ser a sua própria alma?

Ficou um pouco a meditar sobre que sentimentos seriam permitidos a um homem sem alma… Pensou, mesmo, em perguntar a outro homem sem alma que sentimentos já tinha experimentado, mas depois lembrou-se que não conhecia nenhum… Imaginou que houvessem mais… Mas não o podia garantir!

(És um homem sem alma!)

(És um homem sem alma!)

(És um homem sem alma!)

Sentiu o coração bater forte, a respiração pesada, o suor a escorrer na sua face gelada e….

Despertou! Sobressaltado!

Recompôs-se e apanhou o livro do chão! Enquanto o levava para o arrumar no seu lugar, privilegiado, na estante… Pensou… É, de facto, curioso ter sonhado com o funeral da sua própria alma! Ele, que sempre quis ser cremado… Não gostava nada daquelas visitas deprimentes a cemitérios! Não queria que os seus netos o fossem visitar a um sítio daqueles… Preferia, com certeza, ser cremado… O fogo é místico…. Do fogo renasce a Fénix! E claro, que as suas cinzas fossem espalhadas numa bela montanha, ao sabor do vento e que voassem para onde quisessem… Até à mais bela nascente de água, até ao pico mais alto e o mais profundo dos vales! Que cai-se em árvores e que arbustos… e em animais que as transportariam, ainda, mais longe! Era libertador sonhar com esta vida após a morte!

E quando os seus netos o fossem visitar e vissem com os seus olhos aquela paisagem e perguntassem:

- Que bonito, pai, o que é?

A resposta do pai, seu filho, fosse:

-Isto, meus filhos, é o vosso avô!

(um homem sem alma)

sexta-feira, julho 06, 2007

DaRk AnD tWiStY

My heart is total insane,
Your soul is inside me,
Don't pick these words in vain...
We do not need to bleed,

A man flirts his wife,
I don't wanna this for you,
Dark...it's dark...time to blame,
But not for you...

See my soul,
As I see your eyes...
I am your tool
You don't have to cry...

Tonight...you feel sleepy?
I am just right your side...
And why?Because I am as well
DaRk AnD tWiStY...

Dedicado à minha tutu ("You Know you're right")

quinta-feira, junho 28, 2007

P.I.A.N.O

Peace in everything i see,
Calm down the sea,
I feel your toutch...

Nothing else matters to me,
I fight everyday for a issue
Better life for me,

Believe...touch...seek
Can you say that you are free?

Hold on my hand,
Push me with my piano,
Tell me you stand inside my love,

The piano I'll be
I feel your touch...body... lips
And a song will be on
Do not be so strick

Put everything away
Imagine you and me
And our love
Nothing matters...what they say...and
Obviously... love you'll see

(no title)

I'm in rage...i can't say...
What happenned today...
I didn't sleep so well

Farewell, goodbye...
I don't see a smile,...
Slay me inside,

Fuck the wound I have
In my heart...
Feeling like a whore?

Become the beginning, the start
Try another way
Can't say what...

All of you stare at me,
But can you see inside?
Can you really spit in my face?

Shut a fuck up
Vanish my rage
But....


Stay up...do not give up
Stay with me tonight,
And become my new fight...

Try passing by
Can't open...
You're not bronken...

Feel me tonight....

quarta-feira, junho 27, 2007

Me again

There's a time,
Once upon a time,
A guy who lived alone...
But his heart felt like stone,

No more dreams inside his head
No love i saw there...
But one day...a special day...
He knew a girl...and he wanted to stay,

He felt the ghost again
And fogs entered in his head like a train
But this love revealed to be strong and remain..
Till today...

I thought I was empty,
But something in you mixed up my veins...
Put away my pain...

I think I'm new again
So that's why I am remembering you...
And my heart is in flames....

Dedicado à minha Tutu ("You know you're right")

segunda-feira, junho 18, 2007

Espera

Espero... e nada espero...
Olhos fixos no corredor
Aguardando a revelação
Que nas águas da incerteza
Se tornou fado severo,
Esperando sem fulgor
Numa luta sem frieza.

Aguardo... e porque aguardo?
Porque no fundo do túnel obscuro,
Na angustia sufocante
Que parece não ter fim;
Existe um final esperado,
Uma esperança de futuro,
Um fulgor que cresce em mim
Em busca da luz brilhante.

Do nada recomeçar,
Encarar o caminho de frente.
E sem ser diferente...
Voltar a acreditar!

Esperando... e talvez nada esperando...

Lisboa...

Das Sete Colinas…
(onde estão?)
erudidas pelo tempo!
Lisboa…
Das casas sobre casas!
Quantas lágrimas choras, tu, ó Lisboa!?
Onde estão as colinas?
(ou os vales!?)
do meu coração….

Vejo-te agora, Lisboa, bela… Nesta aberta que as nuvens deixam… Pequenos raios de Sol iluminam a tua face para mim… Pequenas gotas escorrem nas tuas encostas…
(lágrimas?)
Lisboa, cartão de visita… Lisboa a preto e branco, Lisboa a cores… Não! Lisboa a 256 tons de cinzento… Cinza… que contrasta com o tempo… Lisboa Cinza, porque choras tu? Quem te trata mal, minha menina?
Hoje, quanto a ti cheguei, vi Lisboa a morrer…. Quis morrer contigo… Não! Quis viver contigo… Quero viver contigo… Quero viver dentro de ti, Lisboa! Deixa-me chorar contigo!

Ahhh…. Lisboa das Sete Colinas… Não! Lisboa das Sete Cidades!
Lisboa-Madrid do poder central….
Lisboa-Barcelona cosmopolita…
Lisboa-Londres capital do império…
Lisboa-Rio de Janeiro das mil e uma cores…
Lisboa-Paris a cidade Luz…
Lisboa-Budapeste das noites Loucas…
Lisboa-Berlim a cidade Morta…
(deixa-me viver contigo!)

Olho, agora, o São Jorge, saliente no céu do crepúsculo… Vejo os bairros que se estendem a teus pés…
(quem mora nesses bairros?)
Lisboa dos contrates… Lisboa a cores e a preto e branco… Lisboa da alegria e da tristeza… Lisboa do Fado e do Bairro Alto…Lisboa da Rua do Ouro e do Casal Ventoso… Lisboa da Alfredo da Costa e dos Prazeres… Lisboa…
(deixa-me chorar contigo!)
O Sol já se foi, não ilumina agora a tua face… Pouco a pouco a vida termina… Não! Á vida começa…
(deixa-me viver contigo!)

Lisboa das casas sobre casas…
Aqui já morou alguém
Daqui já partiu alguém
Aqui já sorriu alguém
Aqui já chorou alguém
Aqui já viveu alguém
Aqui já morreu alguém
Aqui já nasceu alguém
Aqui já se matou alguém…
(quem?)

Sim, aqui nesta casa! Nessa casa… Neste bairro, e nesse bairro…

És tu Lisboa da ilusão e da desilusão! Lisboa é tudo e nada… Lisboa tem alma de gente e corpo de betão! Lisboa tem canção, mas harmonia não! Lisboa tem ricos e tem pobres… Tem alegres e tem tristes! Tem bolsos cheios de dinheiro e outros de cotão!
Roupas de poliéster e camisas de algodão! Gente de carne e osso e outros de titânio e silicone!
Tudo em ti é contraste…

Lisboa a cores!
Lisboa a preto e branco!
Lisboa Cinza…
(quem te apagou o fogo!?)

Lisboa é um manto que escorre rumo ao Tejo! Um manto de casas, casinhas e casebres…
Lisboa são ruas estreitas e a Avenida da Liberdade…
Lisboa é fast-food e “espera que já te atendo!”
Lisboa é traiçoeira, tem cuidado!
Lisboa… Lisboa é o Convento do Carmo!

quarta-feira, junho 13, 2007

Babilónia

Abriu a porta com um, aquele, gesto lento de quem não quer… De quem não pode! A porta deslizou lentamente, como que escondendo algo!

A casa estava arrumada… Minimamente arrumada! Não tinha uma cadeira de baloiço, nem lareira, nem os quadros do Simão… mas sentia-a como o seu Lar!

Abriu o congelador e tirou umas pedras de gelo, serviu-se… de um licor qualquer! Uma bebida num copo com gelo ficou, parada, imóvel, em cima da pequena mesa!

(uma bebida que nunca bebeu… uma bebida que não foi bebida!)

Seguiu caminho até à pequena varanda… Pequena demais para todos os seus sonhos, talvez! Acendeu um cigarro que fumou! Sentiu o fumo entrar-lhe nos pulmões… Como o ar frio numa manhã de Janeiro… Deixou-se ficar a pensar… Mais a pensar nos sonhos que nunca teve, do que nos que perdeu… Mais a pensar no filho que nunca viu crescer do que nos que queria ter… Mais a pensar no que poderia ter tido, mas que nunca sonhou… Na surpresa que o Mundo lhe guardaria se não… Sabia agora que tinha saudades dele… Do seu perfume, não daquele no frasquinho giro que lhe tinha oferecido… Mas, sim, do seu cheiro… Dos boxers no sofá, da toalha de banho no chão, das botas na sala, até daquele habito irritante de deixar sempre alguns pelos no lavatório depois de desfazer a barba…

(queria voltar para dentro!)

Acendeu outro cigarro e deixou ficar a olhar as estrelas… Aquelas constelações que conhecia por ele as ter apresentado… Sorria, lindo, olhando-as como uma criança enquanto contava como se chamavam e onde estavam…

Porque não ouvi com mais atenção!?

Lembrou-se, então, porque tinha comprado uma casa nova… Queria-o fora da sua vida… Queria dizer o Adeus que nunca disse… Queria seguir em frente, mas não conseguiu, pois não?

(uma suave lágrima escorreu no seu belo rosto! hoje, sob este céu estrelado e esta pequeníssima lua em quarto crescente, mais belo que o costume! não que não fosse bonita, mas hoje… e esta lágrima que escorre, iluminando uma pequena parte do seu rosto… esta lágrima que agora se suspende no seu queixo, teimosa... e teima, em não cair e não cai mesmo…. ela limpa-a com um suave toque…)

Porque é que não lhe disse antes… Se tivesse dito, naquela manhã de Outubro… Se… Talvez…

(porque não disse!?) – agora nunca saberei

(dizer o quê? – conta-me a mim, eu sei… eu sei os se’s, e os talvez… – dizer o quê?)

Começou a chorar, não de forma violenta ou patética… Um choro profundo de tristeza e desconsolo, um choro do coração que não se ouve ou se vê…

(mas eu vejo, eu sinto, eu sei… conta-me? dizer o quê?)

O Adeus que nunca disse… O Adeus que nunca disse… O Adeus…

Adeus…

Adeus…

Adeus…

(como se repetir três vez adiantasse de alguma coisa, agora não… é certo… agora não… porque não disse logo naquela manhã de Outubro… porque não…)

Pensou no seu rosto a sorrir quando lhe contasse, o sorriso que nunca viu, a alegria que nunca sentiu… Que podia ter sido com aquele pôr-do-Sol, naquela praia perto de casa, naquela tarde de Outubro… Mas naquela manhã preferiu não dizer… Não o queria deixar expectante… Já sabia como ele iria ficar… Como ficava sempre… Porque não lhe disse… Se lhe tivesse dito talvez ele…

(dito o quê?)

Talvez ele… Talvez o Simão… Talvez o Simão não se tivesse matado…

(dito o quê?... tu não sabes… tu não sabes isso, mas eu sei! deixa-me ajudar-te…)

Sim, naquela manhã de Outubro, em que o Sol espreitava tímido por entre algumas nuvens cinzentas… como gostava de o ver assim na cama, calmo e lindo, a respirar profundamente, tão suave quanto o Sol a levantar-se no horizonte… Esse Sol que ele olhava, agora, desconfiado… E ela já pronta, olhava-o com censura… Espreguiçou-se lentamente e levantou-se pronto da cama, deu-lhe um beijo terno, ela sentiu… e sabe agora que foi o seu último beijo… Podia ter respondido mais apaixonadamente… Mas tinha pressa queria fazer-lhe uma surpresa quando chegasse a casa… Queira mesmo, sinceramente… não o diz agora que não há nada a fazer… Queria mesmo… Soluçou!

(que surpresa? – conta-me!)

A noite estava fria, apesar de Junho se encontrar já no final, abraçou-se a si própria… Não queria voltar para dentro… Sentia-se próxima dele, ali… Apesar da casa ser outra, não a casa das suas recordações… mas era uma casa, um Lar…

Queria tanto ter-lhe dito logo…

(dito o quê?)

Porque não disse logo que nessa tarde ia ao médico… que nesse por-do-Sol, naquela praia, naquela tarde de Outubro iram estar a ver a primeira foto do seu filho… Porque não disse que o sabia… que o sentia, mais forte do que si… Aquele sentir que só uma Mãe sabe… Porque não disse logo…

(acendeu outro cigarro… este trazia o sabor metálico que arranha a garganta… queria apagá-lo…)

Sentiu a porta de casa a abrir… Apagou o cigarro e voltou, finalmente, para dentro… Um míudo, que aparentava uns quatro/cinco anos entretinha-se alegremente, fascinado... como qualquer criança… Os seus olhos brilhavam, como ela imaginava que os do seu pai brilhariam naquela idade que agora era sua! Sorriu, e olhou o quadro na parede, como se fosse a primeira vez, ou a última… Na cadeira de baloiço um homem descalçava-se, chegou por trás dele e abraçou-o como se fosse a primeira vez, ou a última!

(simão… tive tantas saudades tuas!)

Suspirou!

quarta-feira, abril 25, 2007

Filmes da nossa vida...

Quantos de nos já nos sentimos identificados com um personagem de um determinado filme? Provavelmente faria mais sentido fazer a pergunta inversa…

Desde o filme de acção, passando por um thriller, drama, filme de terror até à comédia romântica certamente já nos reinventámos através do nosso pensamento projectando o nosso ego em cenários diversos. Esta forma de sermos vistos projectados nos filmes seria uma outra forma de entretenimento para além da trama principal do filme em si. Sem direitos de autor nem autorização de emissão vamos construindo películas que extravasam a nossa própria realidade ou a do filme que estamos a ver naquele momento, editando conforme os interesses da nossa mente.

Eu arriscaria que esta forma de nos projectarmos para fora da realidade estaria na génese do cinema em si como materialização daquilo que o cérebro humano sempre fez, ora durante o sono ou até mesmo em alguns momentos em que estamos acordados

Depois temos o suporte em que está guardado o filme que pode ir desde as bobinas de projecção em cinemas passando pelo VHS em formato magnético, sem esquecer o formato digital até chegar ao formato neuronal formado a partir das virtualmente infinitas possibilidades de ligação dos nossos neurónios entre si possibilitando uma combinação de cenários e personagens igualmente incontável. Se nos primeiros formatos o filme é unidireccional, nos últimos, as possibilidades de combinação entre neurónios conduzem a diversas possibilidades de desfecho resultado do estado físico/cognitivo/afectivo actual de determinado indivíduo. De certa maneira podíamos imaginar o nosso destino, o “filme” das nossas vidas, como resultado de sucessões de predisposições numa dinâmica de interacção de situações internas e externas inseridas num espaço/tempo determinado e variável a cada momento do nosso dia a dia.

Em genérico, o nosso cérebro tem a capacidade de “visualizar” o que nos vai acontecendo a nós ou até aos outros, realidade ou ficção e de construir na nossa mente uma reprodução mais ou menos fiel ao que aconteceu (memória), numa interacção mais ou menos intensa com outros fragmentos na nossa memória (criatividade). Em suma somos seres inteligentes com capacidades de tomar decisões a cada instante.