Pedro adormeceu sobre os lençóis brancos isentos de culpa do
hospital...as horas passaram tão depressa que nem deu conta do seu inglório
presente. Preocupado, Pedro estava realmente preocupado. Havia algo que o
inquietava, ainda escutava um burburinho de corredor, mas por estar demasiado
“pedrado” não se conscientizou com aquele inferior momento. Estava mais
concentrado na busca do seu subconsciente e, procurava quase insano a resposta
aos seus pecados, ou a falta deles, quiçá. Perguntava-se sobre aquela abordagem
tão evidente, só algo de ruim poderia vir daqueles lobos de rua...A voz da
enfermeira acordou-o:
Pedro: Lúcia? És tu Lúcia?
Enfermeira Maria: Descanse Dr. Pedro, ainda está no hospital, sou
a enfermeira Maria. Vá, agora durma um pouco para recuperar.
Pedro adormeceu de novo e pensava, naquele sorriso, daquela voz,
daquela paixão louca em lava que fervilhava dentro de Lúcia como se não
existisse o amanhã. Sentia-lhe o cheiro ainda nas veias, no seu sonho
consciente estava com ela...queria-lhe certamente, o ósculo que o vento lhe
levara no silêncio do corpo dos amantes, onde os lábios quebram a barreira do
Universo e as mãos, numa só, desenham o equilíbrio do sangue. E agora?
Quando Pedro acordou, já eram 17 horas do dia seguinte.
Enfermeira Maria: Como está Dr. Pedro? Sente-se bem?
Pedro: Sim, acho que sim.
Enfermeira Maria: Então deixo-lhe aqui um lanchezinho para ganhar
as forças. Quando estiver pronto vá ter comigo à recepção que precisamos de
falar consigo.
Pedro: Claro, obrigado.
Pedro apressou-se para sair daquele lugar estranho, tinha poucas
certezas, mas um que tinha é que não gostava de hospitais, aquele cheiro
característico percorria-lhe as artérias do sofrimento.
Enfermeira Maria: Foi rápido Dr. Pedro, sente-se aí um pouco que
já vou ter consigo.
Pedro: Obrigado.
A enfermeira Maria, acompanhada por outras enfermeiras comentava
que o Dr. Pedro tinha sido trazido de uma forma misteriosa na noite anterior em
mau estado.
Pedro, intrigado desconjuntou a sua carteira
em mil pedaços, mas não faltava nada, nada, mesmo nada de nada, como se ele
tivesse sido arremessado de um miradouro qualquer. Sim, Pedro estava bastante
intrigado, no entanto, lembrava-se da voz do homem antes de acordar naquele
hospital: “Não
vais morrer de amor, Pedro...pelo menos hoje!”
Uma voz
que não conhecia, uma voz misteriosa que sabia o seu nome, uma voz que começava
a ganhar volume na sua cabeça...
Enfermeira
Maria: Dr. Pedro? Dr. Pedro?
Pedro:
Sim, desculpe, estava ausente.
Enfermeira
Maria: Não se preocupe. Precisamos da sua assinatura para a alta.
Pedro:
Sim, sim.
Em
segundos assinou a papelada e pousou a esferográfica no balcão em pedra mármore
já gasta pelos anos consentidos. Merecia restauro, pensou Pedro, mármore
daquele já se vê pouco. Respirou e disse:
-
Pedro: Boa tarde minhas senhoras e muito obrigado.
-
Enfermeira Maria: Boa sorte Dr. Pedro, boa sorte!
Quase a
chegar à porta, meteu a mão no bolso e sentiu algo estranho amarrotado. Era um
guardanapo de pastelaria, e dizia:
-
Vem ter comigo, Rua Morais de Soares, 135 – 2º Esq. Lúcia.
O
coração de Pedro parou sobre um desenho onde as vicissitudes da pele trespassam a pigmentação da própria cor,
numa paleta onde a magia nasce e
saboreia os contrastes da tinta alterada pelo amor; submissa à vontade do
mestre, a tela absorve a magia do ser e embebeda-se no percurso incerto do
destino. São as tibiezas da pele que traduzem a natureza ao universo e Pedro,
sorriu.
3 comentários:
Bem-vindo a bordo Ajspatricio!
Estava à espera de uma grande estreia da tua parte e, deixa que te diga, não desiludiste!
Gostei muito da forma fluida como deste continuidade ao "Morrer de Amor" e da esperança que devolveste ao Pedro.
Venham mais!
😀
Brutal! Adorei! Muito bem escrito e graficamente emotivo.
Melhor de tudo é que sem combinarmos os textos podem ser entrosados.
Bem-vindo!
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