terça-feira, novembro 11, 2003

Permaneço

Choro ao longe, distante do calor da alma. O fulgor dos dias passou e eu permaneci. Estagnei neste mundo gelado, onde só encontro dor e desespero. Eras o meu raio de luz, mas tu também partiste. E agora, sem esperança, sem sonhos, permaneço. A morte parece ser a solução, mas até ela se replete de um manto de força que eu não tenho.
Ainda parece ontem o dia em que te foste, e já faz tanto tempo... Sei que o meu último sopro é para ti, na tentativa vã de te encontrar. À muito que ouvi os teus passos, e esses foram só para partir. Não te censuro, nunca. Compreendo a tua necessidade de um amor mais límpido, não revestido desta escuridão que me assola. Se tivesses ficado, estavas destruído, e tal, eu não suportaria, e a dor seria maior, e o desepero mais profundo, mais negro. Continuo a chamar por ti, tenho que continuar... Os meus demónios consomem-me e a clareza da tua miragem é a razão do meu continuar. A morte parece tão longe, sei que não posso chamá-la, tenho que expiar todo este mal que me assola, e partir não aplacaria quem procura a vingança. Permaneço, qual figura trágica da ópera, sabendo qual o meu destino, caminhando para ele lentamente. Escrevo estas palavras na esperança que um dia as leias e me perdoes. O amor não foi suficiente, nunca é suficiente, mas levo comigo, neste sargaço a que chamo alma, um résquio do teu amor, e continuo, sabendo que te encontrei, e que te amei.
Continuo nas sombras, tal não é a ironia do destino, tu que resplandeces luz, e que por momentos me inebriaste. As minhas pegadas são sangue e lágrimas, não pelo que tenho que cumprir, mas pela dor que te causei. Desejo tanto que sejas feliz, que a minha presença não tenha contaminado a limpidez do teu riso, e que eu seja apenas um fantasma de outra era. Amei-te tanto, amo-te tanto. Espero que um dia alguém te susurre aos ouvidos as minhas hereges palavras, profanas no teu resplendor. Espero não ter imaculado os teus dias, perdoa-me se o fiz.
Vou continuar o meu choro, qual hárpia lamentosa, e o meu percurso, e cumprir o meu destino. As sombras e os demónios acompanham-me, e entre eles antevejo o traço límpido do teu sorriso. Continuo, assim, contigo.

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